segunda-feira, 15 de agosto de 2011

E continuou

Andava cabisbaixo, como de costume. Sorria pouco, e nesse pouco, sempre chorava por dentro. O passado lhe remoía, nunca lhe abandonava, somente esse. Era um dia chuvoso, típico de São Paulo, caminhava por ai dentro do seu terno caro, com sua maleta na mão, pensava no que diria naquela reunião. Então, sem mais nem menos, o passado o atacou novamente, todos os seus fantasmas lhe assustavam, estava prestes a ter um surto ali mesmo, no meio da Avenida Paulista, sabia disso, e resolveu se esconder.
Correu até um bar, sentou na ultima mesa, aquela no fundo, escondido, onde nem os atendentes o visualizavam, queria estar só, queria acabar com tudo isso, queria viver, mas não podia, não conseguia. Nenhum de seus psiquiatras conseguia ajudá-lo, e ele sentia-se incapaz de ajudar-se.
Suas mãos suavam e tremiam enquanto ele tentava segurar o choro, enquanto tentava acalmar ao menos a face, já que a alma não se acalmaria.
Levantou e saiu correndo, no meio da rua avistou um prédio em construção, para lá foi, chorando como criança, tristonho, procurando salvação. Subiu até o último andar escondido, sentia o cheiro de cimento, ouvia os pedreiros gritando e cantando felizes, invejava-os.
Carlos era um advogado de sucesso, seu nome era conhecido por todos os lados, mas ninguém o conhecia, o seu íntimo era um mistério. Agora ele se via em uma situação que jamais previra, sentia inveja de pedreiros. Carlos nunca abaixou a guarda, sempre se colocara em um pedestal grego, do qual nunca quis sair. Agora estava ali, sozinho, abandonado por todos e por si mesmo.
Quando chegou ao último andar, abandonou sua maleta, olhou para os lados, sentia-se perto do céu, queria sentir a paz que o céu transmitia, perguntou-se como faria para estar junto dele, queria velejar pelas nuvens, queria sorrir, olhou as pessoas lá de cima e sorriu, pensou nas vidas medíocres das mulheres que passavam bem vestidas abaixo dele. Correu para o outro extremo do prédio, viu crianças cheirando, sentiu pena.
Olhou para si e viu uma mesma criança, entendeu uma velha música que sempre lhe atormentava. Parece cocaína, mas é só tristeza. Repetiu para si mesmo. Sabia que de fato era. Sentou-se e chorou. Então ouviu aquele velho barulho que o irritava, reconheceu-o facilmente, era o celular. Ignorou uma vez, lembrou-se da reunião que marcara. Em sua mente a vontade de ignorar foi menor do que todos os problemas que apareceram, tinha de trabalhar, precisava de dinheiro para sustentar o luxo da família, acabara de comprar uma casa nova e precisava pagá-la. O celular novamente tocou, Carlos limpou os olhos com os dedos, e atendeu, ouviu apenas um "você está atrasado!", sem questionar, pegou a maleta, desceu do prédio, pegou um táxi e sumiu, foi em direção a reunião, em direção ao seu inferno pessoal. E continuou, longe do céu, longe da paz.

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